Poemas & Poetas indeléveis de 2021:
Artur Madruga
22 de dezembro de 2021
seleção de José Couto
por Artur Madruga
seleção de José Couto
por Artur Madruga
DESORDENS DO TEMPO
E se o teu argumento,
Misterioso,
Invadisse o pensamento
Balouçando, teimoso
Sob a tênue brisa do vento?
Pensarias inventos
Onde apenas a junção de ideias
Estrutura em ordens
As desordens do tempo?
O QUE CRESCE?
O que cresce
Não é o teu orgulho.
O que cresce
Não é a tua resistência
À mudança.
O que cresce
Não é a tua ambição desvairada.
O que cresce
Não é a arrogância
Que te prosta.
O que cresce
Não é a tua soberba
Intransponível.
O que cresce
Não é a tua aridez
Interior.
O que cresce
Não é nada disso.
O que cresce
Sufoca,
Impulsiona;
É o sabor do aprendizado,
E a lição a ser aprendida.
O que cresce
É a insistente versão
Do que a vida te oferece,
E não consegues ver.
O que cresce
É a oportunidade
Que te espera.
A acalentadora companhia,
Que só tu podes oferecer,
À inexistente solidão de tua alma.
BRINQUEDO
Sobre nuvens
De argila,
Esculpíamos levezas.
Pincéis e tintas,
Além de,
Nas mãos,
Uma magia,
Uma folia,
De risos e riscos
Coloridos,
Reluzindo formas:
Fiávamos as linhas
De uma original composição.
CLAUSTRO
Apenas rasguemos
As vestes, meu doce inimigo.
Isentemos dos corpos
Pesadas armaduras.
Livremos o medo
Do limite que o finda.
Onde se quebra
-E se esfarela-
A branca porcelana
Da lua.
Vemo-nos por inteiro
TRABALHO
O poeta luta,
À margem do invisível,
Dilacerando a pele em cores,
Tomando formas,
Imaginando espaços
Conquistados.
À tarefa,
De tal maneira,
Envolve-se,
Tingindo de púrpura
A solidão de um corpo
Disforme.
ARGUMENTO
Molda, em lama,
A solidão.
Dentro do corpo,
Se necessária – e corajosa,
Segue de um ponto ao porto.
Imagens ultrapassadas,
Viagem única
– e sem emoção.
INSURREIÇÃO
Sob meus olhos
Ocorre
O sangramento diário
De um país
Que perece.
Devo gritar,
Exigir da poesia
Alguma solução.
Ela é senão algo que flui
Da própria vida e,
Alienada,
Tomba junto com
Nossos corpos.
RÉQUIEM
A praça
Solitária,
Escura,
Espera:
O sinal,
O grito gutural,
Que ao perdido
Salvará.
A palavra,
Arma de ação e combate,
Propriedade absoluta
Do que chamamos pensamento,
Envolve e silencia,
Como um espectro vazio,
O que deveras sente.
O réquiem está pronto,
Composto
Por emocionado violinista,
Para as mortes diárias
De onde ressuscitamos constantes.
Insistimos,
Diante de tanta magia,
Para que a derradeira nota
Coincida
Com a finitude da partitura.
ESPANTO
De todas as sombras
Que passam por mim
E de mim são
A que mais me assusta
É justamente aquela
Pela qual se apaixona
– e enlouquece –
O pobre e bêbado
Coração.
GERAÇÃO AI-5
Não nos permitiram a expressão,
A rejeição da espera,
A distância dos compartimentos,
O crescimento fora das jaulas,
O tesão pela vida,
A não deformação.
Quiseram-nos sob títulos:
Geração AI-5,
Sobrevivendo com o que
Sobrou.
Amputados,
Sem que houvéssemos concedido.
Queremo-nos inteiramente novos,
Embora as palavras não consigam,
Ainda,
Representar este novo.
Estamos entupidos de culpas:
Da raça,
Da família,
Do indivíduo,
Das religiões.
Ainda não somos livres,
Porque ainda não aprendemos
A evitar as inverdades que,
Em nossas mãos,
A classe dominante deixou:
Um débil lusco-fusco
Atravessando o sereno.
PERDAS
É noite e chove
Todas as poesias perdidas, vistas.
Pela janela, a espessa solidão
Espia, dobrada em força.
E coragem.
Emperrada, amolada e moldada;
Pela paixão,
Pelo vento que,
Leve,
Pulveriza todas as palavras
E as açoita,
Pelo puro prazer de fazê-las
Não mais existir.
TRANSPARÊNCIA
Conspiração e medo
Ressurgem, vez em quando,
Em noites de grandes alucinações.
Vertiginosas viagens
Através de abissais silêncios.
Bem maior que a inquietude,
Teu imutável ser
Em mim guarda uma luz,
Certo corte final,
Uma fugaz emoção.
Tudo, em todo momento,
Tolda, em teu pensamento,
A grande aparição
DESTINO
Sou sim
Um caracol
Que sai à terra fria,
Resvalando mansamente
Sobre o trilho dos meus sucos.
Fujo
Do casulo
Ao ar quente,
Deixando um rastro
De pólens e cores
Levados pelas asas do vento
FLORAÇÃO
Quando acontece
É assim:
Um revoar
De pombos
Depois do amor
Sobre o capim.
Uma porção
De tombos
Cambalhotas
No jardim.
INVENÇÃO
Sou o inventor de lagos
Mergulhos
Em noites
Night blue.
Confecciono ausências
Inviabilizo estridências
Janis Joplin
Pássaro azul.
Invento
No meu inventar
A crueldade
Da imaginação.
Suores e transpirares
Invento a mais cruel
Das dores:
Invento a paixão.
E se o teu argumento,
Misterioso,
Invadisse o pensamento
Balouçando, teimoso
Sob a tênue brisa do vento?
Pensarias inventos
Onde apenas a junção de ideias
Estrutura em ordens
As desordens do tempo?
O QUE CRESCE?
O que cresce
Não é o teu orgulho.
O que cresce
Não é a tua resistência
À mudança.
O que cresce
Não é a tua ambição desvairada.
O que cresce
Não é a arrogância
Que te prosta.
O que cresce
Não é a tua soberba
Intransponível.
O que cresce
Não é a tua aridez
Interior.
O que cresce
Não é nada disso.
O que cresce
Sufoca,
Impulsiona;
É o sabor do aprendizado,
E a lição a ser aprendida.
O que cresce
É a insistente versão
Do que a vida te oferece,
E não consegues ver.
O que cresce
É a oportunidade
Que te espera.
A acalentadora companhia,
Que só tu podes oferecer,
À inexistente solidão de tua alma.
BRINQUEDO
Sobre nuvens
De argila,
Esculpíamos levezas.
Pincéis e tintas,
Além de,
Nas mãos,
Uma magia,
Uma folia,
De risos e riscos
Coloridos,
Reluzindo formas:
Fiávamos as linhas
De uma original composição.
CLAUSTRO
Apenas rasguemos
As vestes, meu doce inimigo.
Isentemos dos corpos
Pesadas armaduras.
Livremos o medo
Do limite que o finda.
Onde se quebra
-E se esfarela-
A branca porcelana
Da lua.
Vemo-nos por inteiro
TRABALHO
O poeta luta,
À margem do invisível,
Dilacerando a pele em cores,
Tomando formas,
Imaginando espaços
Conquistados.
À tarefa,
De tal maneira,
Envolve-se,
Tingindo de púrpura
A solidão de um corpo
Disforme.
ARGUMENTO
Molda, em lama,
A solidão.
Dentro do corpo,
Se necessária – e corajosa,
Segue de um ponto ao porto.
Imagens ultrapassadas,
Viagem única
– e sem emoção.
INSURREIÇÃO
Sob meus olhos
Ocorre
O sangramento diário
De um país
Que perece.
Devo gritar,
Exigir da poesia
Alguma solução.
Ela é senão algo que flui
Da própria vida e,
Alienada,
Tomba junto com
Nossos corpos.
RÉQUIEM
A praça
Solitária,
Escura,
Espera:
O sinal,
O grito gutural,
Que ao perdido
Salvará.
A palavra,
Arma de ação e combate,
Propriedade absoluta
Do que chamamos pensamento,
Envolve e silencia,
Como um espectro vazio,
O que deveras sente.
O réquiem está pronto,
Composto
Por emocionado violinista,
Para as mortes diárias
De onde ressuscitamos constantes.
Insistimos,
Diante de tanta magia,
Para que a derradeira nota
Coincida
Com a finitude da partitura.
ESPANTO
De todas as sombras
Que passam por mim
E de mim são
A que mais me assusta
É justamente aquela
Pela qual se apaixona
– e enlouquece –
O pobre e bêbado
Coração.
GERAÇÃO AI-5
Não nos permitiram a expressão,
A rejeição da espera,
A distância dos compartimentos,
O crescimento fora das jaulas,
O tesão pela vida,
A não deformação.
Quiseram-nos sob títulos:
Geração AI-5,
Sobrevivendo com o que
Sobrou.
Amputados,
Sem que houvéssemos concedido.
Queremo-nos inteiramente novos,
Embora as palavras não consigam,
Ainda,
Representar este novo.
Estamos entupidos de culpas:
Da raça,
Da família,
Do indivíduo,
Das religiões.
Ainda não somos livres,
Porque ainda não aprendemos
A evitar as inverdades que,
Em nossas mãos,
A classe dominante deixou:
Um débil lusco-fusco
Atravessando o sereno.
PERDAS
É noite e chove
Todas as poesias perdidas, vistas.
Pela janela, a espessa solidão
Espia, dobrada em força.
E coragem.
Emperrada, amolada e moldada;
Pela paixão,
Pelo vento que,
Leve,
Pulveriza todas as palavras
E as açoita,
Pelo puro prazer de fazê-las
Não mais existir.
TRANSPARÊNCIA
Conspiração e medo
Ressurgem, vez em quando,
Em noites de grandes alucinações.
Vertiginosas viagens
Através de abissais silêncios.
Bem maior que a inquietude,
Teu imutável ser
Em mim guarda uma luz,
Certo corte final,
Uma fugaz emoção.
Tudo, em todo momento,
Tolda, em teu pensamento,
A grande aparição
DESTINO
Sou sim
Um caracol
Que sai à terra fria,
Resvalando mansamente
Sobre o trilho dos meus sucos.
Fujo
Do casulo
Ao ar quente,
Deixando um rastro
De pólens e cores
Levados pelas asas do vento
FLORAÇÃO
Quando acontece
É assim:
Um revoar
De pombos
Depois do amor
Sobre o capim.
Uma porção
De tombos
Cambalhotas
No jardim.
INVENÇÃO
Sou o inventor de lagos
Mergulhos
Em noites
Night blue.
Confecciono ausências
Inviabilizo estridências
Janis Joplin
Pássaro azul.
Invento
No meu inventar
A crueldade
Da imaginação.
Suores e transpirares
Invento a mais cruel
Das dores:
Invento a paixão.
Nascido em Porto Alegre, Artur Madruga é formado em Magistério, Pedagogia e tem Pós-Graduação em Arte Educação. Residiu um ano em São Paulo, onde se dedicou ao grupo de teatro dos comissários da VASP, orientado pelo grupo União e Olho Vivo. Foi várias vezes premiado, e, dentre as premiações, podem-se destacar a Revelação Literária Apesul/Habitasul/Caldas Júnior/ Instituto Estadual do Livro/78, em Contos, no Rio Grande do Sul; Menção Honrosa do Prêmio Guilhermino César, da Universidade de Ijuí/RS, 1980; e Menção Honrosa do Prêmio Fernando Chinaglia, da União Brasileira de Escritores, Órgão da Academia Brasileira de Letras, RJ, 1981. Publicou Tiremos a sorte (Tchê!, 1986); Dyonelio Machado, Coleção esses gaúchos, (Tchê!,1987); poemas na antologia "Poesia de Ouro – 104 poemas garimpados nas redes sociais" (Penalux, 2018); a trilogia de "A formiguinha skatista", "A formiguinha grafiteira" e "A formiguinha inventora" (2019); e "A Cor do Gesto" (Penalux, 2019) e "Desordens do tempo" (Penalux 2020).
|
José Couto (Porto Alegre/RS). Professor e poeta brasileiro. É o autor de “A impermanência da escrita” (2010), “O soneto de Pandora” (2017) e “O unicórnio do sul e outras lendas poéticas” com ilustrações de Luiza Maciel Nogueira (2018). E dos inéditos “quase quasares” poesia,”Sete Cânticos Negros”, poesia, arte plástica e música, TOTEM (poesias a quatro mãos) com arte de Artur Madruga.
|