Cinco poemas de José Juva
16 de abril de 2022
Seleção João Gomes
Seleção João Gomes
o gari falando comigo sobre poesia
a dançarina de brega falando comigo sobre poesia
Lionel Messi falando comigo sobre poesia
o vendedor de pipocas falando comigo sobre poesia
o turco perseguido pela yakuza falando comigo sobre poesia
a vencedora do miss bumbum falando comigo sobre poesia
a garota do combate à dengue falando comigo sobre poesia
Rui Chapéu falando comigo sobre poesia
o astronauta aposentado falando comigo sobre poesia
o palhaço degolado falando comigo sobre poesia
a ventríloqua falando comigo sobre poesia
a mímica falando comigo sobre poesia
Pelé calado
ao meu lado
dias e noites molhando a cachola na sarjeta,
pisando em pregos, roubando a comida dos cegos
ao meio dia, encontrando mais carros que amigos
você sabe que a espécie humana continua o massacre
uma dúzia de guindastes estacionados
sobre teus pés, nove milhões de chimpanzés
viciados em barbitúricos, as mandíbulas esmagadas
das florestas, vertebrados engolidos pela sanha sapiens
toda merda e urina das cidades armazenada na pupila
do lixo eletrônico, toneladas de carvão arrancadas
das tripas de minha bisavó, trilhões de cigarros
fumados no sofá do caos & conforto:
ossos, acumulação & desperdício.
e os policiais ainda acham um barato
apertar o gatilho.
hoje pela manhã um mendigo me salvou
com algumas baforadas e brasas
enquanto me dizia que
o gato é uma gota
de tigre
e que não há nada a pedir às deusas
nem desodorante, nem pizza
nem teto, nem saúde, nem dentes
nem viagens de ácido, nem travesseiros
projetados pela Nasa, nem pernas mecânicas
nem pastilhas para refrescar o hálito, nem pão
basta deixar os pés na poeira e fazer
a travessia
como um sabonete despreocupado com seu fim
deixando tudo cheiroso
esse aí não diz coisa com coisa e vive
de mãos dadas com o silêncio dizendo
que o vento está visivelmente cansado
esse aí não diz coisa com coisa e uiva
e canta e dança e dá um nó na pança
depois joga xadrez sozinho na sarjeta
esse aí não diz coisa com coisa e vaza
entre carros, motos e corujas de plástico
antes que a polícia pule no seu pescoço
esse aí não diz coisa com coisa e vigia
os pombos comendo pipoca no asfalto
e os ratos lhe trazem um pouco de queijo
esse aí não diz coisa com coisa e visita
todas as árvores que restam na cidade
e carrega muitas folhas debaixo da língua
esse aí não diz coisa com coisa e vai
feito um vulto que valsa nas praças
no meio dos que não estão descalços
esse aí não diz coisa com coisa e vê
formigas de ferro bem no cocuruto
dos que se apressam e passam
esse aí não diz coisa com coisa e vadio
trabalha na alucinação das carnes
e consegue ser feliz ao meio-dia
a vida não erra um murro nem cansa
de ampliar seu repertório de coices
tua vó obreira da assembleia de deus
com o encosto da síndrome do pânico
teu cachorro com câncer no cu e cego
tua tia cuspindo farofa todo domingo
teu vizinho fã do George Israel e do Kenny G
tua cidade de esgotos na língua do sol
teu professor pedindo asilo na loja de óculos
tua prima grávida da solidão no vietnã
teu primeiro amor de mãos dadas com a morte
tua cirrose sorrindo às seis horas da noite
teu país nocauteado pelo incêndio e pelo ódio
tua voz presa dentro duma garrafa de coca-cola
teu silêncio deitado na caçamba do lixo hospitalar
tua espécie embriagada de gasolina e diesel
teu futuro mancando à beira do abismo
tua mãe mordida pelos dentes da loucura
a dançarina de brega falando comigo sobre poesia
Lionel Messi falando comigo sobre poesia
o vendedor de pipocas falando comigo sobre poesia
o turco perseguido pela yakuza falando comigo sobre poesia
a vencedora do miss bumbum falando comigo sobre poesia
a garota do combate à dengue falando comigo sobre poesia
Rui Chapéu falando comigo sobre poesia
o astronauta aposentado falando comigo sobre poesia
o palhaço degolado falando comigo sobre poesia
a ventríloqua falando comigo sobre poesia
a mímica falando comigo sobre poesia
Pelé calado
ao meu lado
dias e noites molhando a cachola na sarjeta,
pisando em pregos, roubando a comida dos cegos
ao meio dia, encontrando mais carros que amigos
você sabe que a espécie humana continua o massacre
uma dúzia de guindastes estacionados
sobre teus pés, nove milhões de chimpanzés
viciados em barbitúricos, as mandíbulas esmagadas
das florestas, vertebrados engolidos pela sanha sapiens
toda merda e urina das cidades armazenada na pupila
do lixo eletrônico, toneladas de carvão arrancadas
das tripas de minha bisavó, trilhões de cigarros
fumados no sofá do caos & conforto:
ossos, acumulação & desperdício.
e os policiais ainda acham um barato
apertar o gatilho.
hoje pela manhã um mendigo me salvou
com algumas baforadas e brasas
enquanto me dizia que
o gato é uma gota
de tigre
e que não há nada a pedir às deusas
nem desodorante, nem pizza
nem teto, nem saúde, nem dentes
nem viagens de ácido, nem travesseiros
projetados pela Nasa, nem pernas mecânicas
nem pastilhas para refrescar o hálito, nem pão
basta deixar os pés na poeira e fazer
a travessia
como um sabonete despreocupado com seu fim
deixando tudo cheiroso
esse aí não diz coisa com coisa e vive
de mãos dadas com o silêncio dizendo
que o vento está visivelmente cansado
esse aí não diz coisa com coisa e uiva
e canta e dança e dá um nó na pança
depois joga xadrez sozinho na sarjeta
esse aí não diz coisa com coisa e vaza
entre carros, motos e corujas de plástico
antes que a polícia pule no seu pescoço
esse aí não diz coisa com coisa e vigia
os pombos comendo pipoca no asfalto
e os ratos lhe trazem um pouco de queijo
esse aí não diz coisa com coisa e visita
todas as árvores que restam na cidade
e carrega muitas folhas debaixo da língua
esse aí não diz coisa com coisa e vai
feito um vulto que valsa nas praças
no meio dos que não estão descalços
esse aí não diz coisa com coisa e vê
formigas de ferro bem no cocuruto
dos que se apressam e passam
esse aí não diz coisa com coisa e vadio
trabalha na alucinação das carnes
e consegue ser feliz ao meio-dia
a vida não erra um murro nem cansa
de ampliar seu repertório de coices
tua vó obreira da assembleia de deus
com o encosto da síndrome do pânico
teu cachorro com câncer no cu e cego
tua tia cuspindo farofa todo domingo
teu vizinho fã do George Israel e do Kenny G
tua cidade de esgotos na língua do sol
teu professor pedindo asilo na loja de óculos
tua prima grávida da solidão no vietnã
teu primeiro amor de mãos dadas com a morte
tua cirrose sorrindo às seis horas da noite
teu país nocauteado pelo incêndio e pelo ódio
tua voz presa dentro duma garrafa de coca-cola
teu silêncio deitado na caçamba do lixo hospitalar
tua espécie embriagada de gasolina e diesel
teu futuro mancando à beira do abismo
tua mãe mordida pelos dentes da loucura